Ouvir o episódio do podcast nas plataformas:
Entenda as razões emocionais e inconscientes por trás da defensividade nas relações e como isso afeta nossa capacidade de conexão.
Viver na defensiva é mais comum do que imaginamos. Às vezes, nem percebemos o quanto estamos armados, prontos para nos proteger de algo que talvez nem esteja acontecendo. No fundo, há sempre um medo escondido. Medo de ser rejeitado, de se magoar, de parecer fraco, de se entregar e não ser acolhido. E esse medo, por mais legítimo que seja, muitas vezes se disfarça de sarcasmo, indiferença, agressividade ou até mesmo de uma aparente autossuficiência. Criamos barreiras emocionais que nos fazem acreditar que estamos no controle, quando na verdade estamos perdendo as chances de viver relações mais autênticas e profundas.
Essas barreiras, muitas vezes invisíveis, surgem como mecanismos de defesa que desenvolvemos ao longo da vida. Seja por experiências dolorosas na infância, por decepções amorosas ou por mensagens culturais que nos dizem que sentir é fraqueza. A defensividade é uma forma de tentar prever o que pode nos machucar e se antecipar ao golpe. É como se disséssemos internamente: “Se eu não me abrir, ninguém vai me ferir”. Mas essa estratégia, apesar de eficiente a curto prazo, cobra um preço alto. Ela nos isola. E pior: mantém viva a ideia de que o mundo é perigoso demais para se viver de peito aberto.
Como o medo molda nossas atitudes
O medo é uma emoção legítima e necessária. Ele nos protege de situações de risco real. O problema é quando ele passa a dominar as nossas relações. Quando vivemos na defensiva, cada gesto do outro pode ser interpretado como ameaça. Uma pergunta vira invasão, uma crítica vira rejeição, um silêncio vira abandono. E então nos tornamos mestres em interpretar sinais que talvez nem estejam ali. Passamos a viver sob o filtro da suspeita constante, como se estivéssemos sempre esperando o pior. Essa postura não nasce do nada. Muitas vezes, ela é resultado de feridas que não foram tratadas, de ausências que marcaram, de palavras que feriram mais do que deveriam.
E é importante entender que esse comportamento não é sinal de fraqueza. Muito pelo contrário. Ele é uma resposta inteligente do nosso sistema emocional que tenta nos manter seguros. Mas é também uma resposta baseada no passado, e não no presente. Quando nos protegemos de algo que já aconteceu, sem perceber que o cenário mudou, nos sabotamos. É como se vivêssemos um déjà-vu emocional constante, projetando antigas dores em novas situações. Por isso, o primeiro passo para sair da defensiva é reconhecer que ela existe. É observar os momentos em que a gente se fecha, se irrita, ataca ou se cala e se perguntar: de onde isso está vindo?
A ilusão do controle como escudo
Um dos disfarces mais comuns da defensividade é a busca por controle. Queremos prever o que vai acontecer, controlar o que o outro sente, saber exatamente como agir para não sermos pegos de surpresa. Essa tentativa de controlar tudo ao nosso redor nos dá uma falsa sensação de segurança. Mas viver assim é exaustivo. E pior: nos impede de viver o presente. A vida se torna uma constante antecipação do que pode dar errado, e as relações deixam de ser espaço de encontro para se tornarem campo de batalha.
Muitas vezes, quem vive na defensiva parece até distante, frio, irônico. Mas por trás dessa armadura, geralmente há alguém que sente demais. Alguém que já sofreu, que não quer passar por isso de novo. Só que ao tentar evitar o sofrimento, essa pessoa também evita o amor, o afeto, a troca real. É um paradoxo doloroso: para não se machucar, a gente se impede de viver. E, com o tempo, essa estratégia vira hábito. Viramos especialistas em afastar o que mais queremos, e depois culpamos o mundo por nos deixar sozinhos.
É possível baixar a guarda?
Sim, é possível. Mas não é simples. Baixar a guarda exige coragem. Requer olhar para dentro com honestidade e reconhecer que viver sempre na defensiva talvez não seja mais necessário. Que as situações mudaram, que as pessoas não são todas iguais, que talvez hoje haja espaço para confiar. Esse processo não é imediato. Ele exige paciência, autorreflexão e, muitas vezes, ajuda. Mas começa com um gesto pequeno: admitir para si mesmo que está difícil confiar, difícil se abrir, difícil se permitir.
A partir daí, começa uma nova caminhada. Uma caminhada em direção à vulnerabilidade não como fraqueza, mas como ponto de partida para relações verdadeiras. Quando abrimos espaço para sermos vistos como somos, também abrimos espaço para sermos amados como somos. E isso, por mais assustador que pareça, é o que mais buscamos. No fim das contas, viver na defensiva não nos protege do sofrimento. Só nos protege do amor.