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O medo da solidão está mais ligado às pressões sociais e emocionais do que à presença ou ausência real de alguém.
Por que temos tanto medo de ficar sozinhos?
Ficar sozinho não significa apenas estar sem companhia. Em muitos momentos, o medo da solidão não nasce da ausência do outro, mas da ausência de conexão consigo mesmo. Durante o episódio, refletimos sobre como esse medo vai muito além da experiência individual. Ele é alimentado pela cultura, pela forma como a sociedade valoriza estar em um relacionamento, ser desejado, ser visto. A ideia de ficar sozinho é frequentemente associada ao fracasso, à rejeição, a algo que precisa ser evitado. Mas e se o problema não for estar só, e sim a forma como aprendemos a lidar com esse silêncio?
Existe um tipo de abandono que não está ligado a quem vai embora, mas ao que nunca chegou. É quando sentimos que falta algo mesmo estando rodeados de gente. É quando buscamos validação constante porque acreditamos que, sozinhos, não somos suficientes. Esse sentimento não nasce do vazio real, mas do vazio que fomos ensinados a temer. A cultura do desempenho, da produtividade, da vida perfeita exibida nas redes sociais reforça a ideia de que precisamos estar sempre acompanhados, disponíveis, desejáveis. E quando isso não acontece, nos sentimos fora do lugar.
No episódio, falamos sobre como esse medo de ficar sozinho acaba moldando nossos comportamentos. Muitas vezes, mantemos vínculos que não nos fazem bem apenas para não encarar o desconforto do silêncio. Aceitamos migalhas de atenção, negociamos a própria verdade, nos afastamos de quem somos. Tudo isso para evitar o rótulo de quem está só. Mas é justamente nesse movimento que vamos nos abandonando. Fugimos da solidão, mas acabamos sozinhos dentro de relações sem profundidade.
A sociedade que nos pressiona a não estar sós
É impossível ignorar o quanto o medo de ficar sozinho é também um produto social. Desde cedo, somos ensinados que estar com alguém é uma conquista, que formar casal é sinal de sucesso, que a vida só tem sentido quando compartilhada. E embora as conexões afetivas sejam de fato importantes, elas não deveriam vir como obrigação ou como resposta a um vazio interno. Quando o estar com o outro vira fuga do estar consigo, perdemos a chance de viver relações mais conscientes.
Durante a conversa, ficou claro que o medo de estar só muitas vezes não vem de dentro, mas do olhar externo. É o medo de ser visto como alguém que não é suficiente para manter alguém por perto. É o desconforto de não ter com quem compartilhar a rotina quando todo o resto do mundo parece estar em pares. E essa comparação constante cria uma sensação de inadequação, como se houvesse algo de errado em escolher, ou simplesmente viver, momentos de solitude.
Mas o que quase nunca é dito é que a solidão, quando acolhida, pode ser um lugar de reencontro. Estar só pode significar um retorno à própria presença, um espaço de escuta, de descanso, de reconstrução. Não é a ausência de alguém que nos fere, mas a falta de conexão com o que sentimos. E enquanto continuarmos tentando preencher esse buraco com a presença do outro, vamos nos manter dependentes de algo que não se sustenta.
A solidão como espaço de reconexão
Reaprender a ficar só é um processo que passa pela desconstrução de muita coisa. É olhar para os momentos de silêncio e perceber que eles não são punições, mas oportunidades. É começar a identificar o que realmente desejamos e o que estamos fazendo apenas para atender às expectativas externas. É aceitar que nem sempre estaremos rodeados de pessoas, mas que isso não significa estar incompleto.
No episódio, também falamos sobre a necessidade de encontrar um lugar dentro da gente onde o abandono não se instale com tanta facilidade. Isso não se constrói da noite para o dia, mas começa com pequenos gestos de presença: respeitar nossos limites, validar nossos sentimentos, parar de correr atrás de relações que não nos escutam. Aos poucos, a solitude vai deixando de ser assustadora e passa a ser um lugar seguro. Um lugar onde podemos voltar sempre que o mundo lá fora parecer demais.
Não se trata de escolher entre estar só ou com alguém, mas de cultivar relações a partir de um lugar mais inteiro. Quando aprendemos a ficar conosco, as relações deixam de ser refúgios e passam a ser encontros. O medo de ficar sozinho perde força porque já não estamos nos deixando. E aí sim, estar com o outro se torna mais leve, mais livre, mais verdadeiro.
Sim, vivemos numa sociedade que nos ensina a temer a solidão. Mas é possível reaprender. É possível transformar esse medo em um convite para a reconexão. E descobrir que, no fundo, a solidão nem sempre é ausência. Às vezes, é só a gente chamando a si mesmo de volta.