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Em muitos relacionamentos, seja no amor, no trabalho ou na amizade, existe um padrão que se repete: o silenciamento. Ele pode vir em pequenas falas, atitudes sutis ou mesmo através de um ambiente que pouco a pouco nos leva a ocupar cada vez menos espaço. Mas como identificar esse ciclo e, mais importante, como sair dele?
Quando o amor anula: a diferença entre apoio e silenciamento
Muitas relações começam de forma equilibrada, mas, ao longo do tempo, um dos parceiros pode começar a se sentir cada vez menos presente na própria história. Comentários como “Você fala demais” ou “Não precisa exagerar tanto” podem parecer inofensivos, mas, com o tempo, vão criando um padrão de anulação.
É comum ver mulheres sendo incentivadas a apoiar seus parceiros, enquanto suas próprias ambições ficam em segundo plano. Quantas vezes ouvimos histórias de mulheres que abandonam suas carreiras para cuidar da família ou para dar suporte emocional a seus companheiros, enquanto o inverso raramente acontece?
As microanulações: quando você para de perceber sua própria voz
O silenciamento raramente acontece de forma brusca. Na maioria das vezes, ele começa com pequenas correções, sugestões ou olhares sutis que parecem inofensivos. Um parceiro que pede para a outra pessoa “falar mais baixo” em uma conversa animada, um chefe que sempre ignora suas sugestões, um amigo que interrompe suas falas e impõe sua própria opinião. Essas pequenas ações se acumulam e criam um ambiente onde sua voz perde a força, tornando o silêncio uma escolha automática.
Esse processo é ainda mais forte em contextos sociais que reforçam a ideia de que mulheres devem ser mais discretas. Frases como “mulher de verdade não precisa se exibir” ou “as mais respeitadas são aquelas que sabem o momento certo de falar” fazem parte desse condicionamento que ensina mulheres a diminuírem sua presença. Esse silenciamento também se manifesta no medo de ocupar espaço ou no receio de parecer “demais”, seja na forma de se vestir, no tom de voz ou na maneira como expressam suas ideias. No longo prazo, a mulher começa a internalizar essa repressão como uma parte normal de sua identidade, sem perceber que está sendo silenciada. O silenciamento raramente acontece de forma brusca. Ele costuma vir disfarçado de cuidado e preocupação. Um parceiro que pede para a outra pessoa “falar mais baixo” em uma conversa animada, um chefe que desconsidera suas sugestões, um amigo que sempre corrige sua forma de se expressar. Pequenos gestos que, sozinhos, parecem insignificantes, mas que juntos criam um ambiente onde sua voz perde a força.
Esse processo é ainda mais forte em contextos sociais que reforçam a ideia de que mulheres devem ser mais discretas, que um “grande homem sempre tem uma grande mulher por trás”, e que a anulação feminina é normalizada.
Silenciamento e a herança cultural: um problema estrutural
Histórica e culturalmente, as mulheres foram ensinadas a se calar. Em diversas religiões, ainda há passagens que afirmam que a mulher deve aprender em silêncio e não pode ensinar um homem. No Brasil, até a década de 1960, as mulheres precisavam da autorização do marido para viajar. No Reino Unido, até a década de 1980, mulheres podiam ser barradas em bares caso não estivessem acompanhadas de um homem.
Essas normas não são apenas “coisas do passado”. Elas ainda moldam a forma como as pessoas se comportam, como as mulheres são vistas no mercado de trabalho e como a sociedade trata a voz feminina em espaços de poder.
Como identificar um relacionamento que te silencia?
Identificar um relacionamento que silencia pode ser desafiador, pois muitas vezes os sinais são sutis e mascarados como cuidado ou proteção. No entanto, alguns padrões se repetem em dinâmicas onde a voz de uma pessoa é sistematicamente diminuída. Você pode estar em um relacionamento que te silencia se:
- Sente que precisa pedir permissão para fazer coisas que gosta: Você se preocupa em como o outro vai reagir ao tomar decisões que deveriam ser individuais.
- Seu parceiro(a) ou amigo(a) frequentemente fala por você: Em reuniões, encontros ou até em interações sociais, sua opinião é substituída pela fala de outra pessoa.
- Quando você expressa uma opinião, logo se sente culpado ou inseguro: Você começa a se questionar se deveria ter falado ou se está “exagerando”.
- Pequenos toques “carinhosos” fazem você duvidar de sua própria autenticidade: Comentários como “Tem certeza que quer se vestir assim?” ou “Isso não combina com você” geram um desconforto sutil, mas constante.
- Você sente que não pode brilhar demais ou ser o centro das atenções: Quando recebe elogios ou se destaca, há um incômodo no ar, como se estivesse fazendo algo errado.
Esses sinais podem indicar um ambiente de silenciamento gradual, onde a pessoa começa a se moldar às expectativas do outro e perde a conexão com sua própria voz. É essencial reconhecer esses padrões para impedir que se tornem uma realidade permanente. Existem alguns sinais claros de que você pode estar sendo silenciado em uma relação:
- Você sente que precisa pedir permissão para fazer coisas que gosta.
- Seu parceiro(a) ou amigo(a) frequentemente fala por você.
- Quando você expressa uma opinião, logo se sente culpado ou inseguro.
- Pequenos toques “carinhosos” fazem você duvidar de sua própria autenticidade (“Você tem certeza que quer se vestir assim?”).
- Você sente que não pode brilhar demais ou ser o centro das atenções.
Se você se identificou com esses pontos, vale a pena refletir sobre como essas dinâmicas estão impactando sua autoestima e identidade.
Como sair desse ciclo?
- Reconheça o problema: perceber que você está sendo silenciado é o primeiro passo.
- Fortaleça sua rede de apoio: amigos e familiares podem ajudar você a enxergar padrões que antes passavam despercebidos.
- Estabeleça limites: aprenda a dizer “não” e a impor espaços onde sua voz seja ouvida e respeitada.
- Busque terapia: trabalhar sua autoestima e aprender a se expressar pode ser um processo transformador.
- Desconstrua padrões internalizados: reflita sobre como sua criança interior foi ensinada a se comportar e questione essas normas.
Conclusão: Espaços de amor devem dar voz, não silenciar
Relações saudáveis são aquelas onde você se sente livre para ser quem é. Se um relacionamento exige que você se anule, ele está te prejudicando. O amor deve incentivar, potencializar, ampliar espaços – nunca diminuí-los.
O verdadeiro amor não silencia, mas dá espaço para que cada um se expresse livremente. Se uma relação exige que você fale menos, esconda suas emoções ou minimize sua existência, talvez seja hora de reavaliá-la. Espaços de amor devem ser seguros, acolhedores e impulsionar o crescimento mútuo, permitindo que cada um se expanda e floresça em sua autenticidade.